quinta-feira, setembro 01, 2011
Para lá da estrada de Damasco

John Kennedy foi a Berlim Ocidental, em 1963, proferir um discurso intemporal, sobre a Liberdade e o modo como o homem se deve opor, por todos os meios, aos crimes contra a espécie humana. A frase “Ich bin ein Berliner” (“Eu sou berlinense”) pode facilmente ser adaptada ao momento que atravessa o povo sírio. Semana após semana, nas ruas e nas prisões, nas casas e nos lugares mais recônditos da Síria, o regime tenta, pela lei das armas e da força, calar as vozes, os corpos e a alma de um povo. É o que resta de um regime que procura preservar um sistema podre e em fim de ciclo.
“Todos os homens livres, onde quer que vivam, são cidadãos de Berlim”, lembrava Kennedy, em Berlim, cidade que durante três décadas havia de separar, pelo betão e arame farpado, um só povo, nascido de um tronco, geografia e valores comuns.
Na natureza das coisas, todos os homens livres, onde quer que vivam, são cidadãos de Damasco, mas a lenta comunidade internacional, os povos solidários e iluminados pelo espírito da Razão e guiados pela chama da Liberdade, as nações justas e democráticas, têm pela frente um compromisso sério e determinado: para lá da estrada de Damasco, há, segundo a Amnistia Internacional, crianças de treze anos que são torturadas e assassinadas, no silêncio dos vales férteis e dos desertos amplos, e outros milhares são atacados por sanguinários de um regime que atenta contra todas as formas de dignidade, a tolerância e os mais elementares direitos. Bashar al-Assad é o responsável principal da matança, afrontando as organizações internacionais, os povos e os pensadores que durante séculos aperfeiçoaram os modelos de Justiça e dos Direitos Humanos, e como tal, deverá ser levado a tribunal, seja em Haia, seja a quo, por crimes contra humanidade, crimes que não prescrevem. Terá que ser julgados todos e cada um dos cobardes assassinos de crianças e de centenas de jovens, e adultos, e ainda pelas detenções arbitrárias.
O grito pela liberdade, democracia e abolição das atrocidades não sucumbe diante dos pés dos plutocratas cruéis e corruptos. Não me venham com explicações suaves, porque perante o assassínio, a tortura e a censura, em nome do ódio e da perpetuação do poder, só existe uma resposta, ainda que demore tempo a sarar as feridas da história. O sangue derramado de todos os sírios vítimas da impiedade e da violência atroz irá um dia encontrar um porto de abrigo, porque “a liberdade é indivisível; se houver um único homem escravizado, nenhum de nós é livre” (Kennedy). E para lá da estrada da cidade mais antiga do mundo, há fome de liberdade. Eu não gosto de ver pessoas a sofrer. Nada mesmo. Eu também sou sírio.

Fonte da fotografia: Olhares.

 
Lavrado por diesnox at quinta-feira, setembro 01, 2011 | Permalink |


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