quinta-feira, agosto 31, 2006
Qual é o medo?
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e os grandes clubes devem por estes dias temer que a sua vidinha possa andar para trás, ponderando os mais diversos cenários, por causa da bagunça gerada pelo «caso Mateus». É que a instância máxima do futebol – a FIFA – pode aplicar uma punição exemplar, para evitar situações idênticas.

Era previsível que mais cedo ou mais tarde do caos cultivado durante anos pelos dirigentes de clubes, órgãos da arbitragem e instâncias reguladores do futebol português – caos que milhões de adeptos e os media agarrados aos excessos de futebol na vida nacional alimentaram – podia nascer «bronca da grossa».

Goste-se ou não de Gilberto Madaíl, Valentim Loureiro e de todas as criaturas «made by the ball», o que o «caso Mateus» põe a nú é mais do que um simples exemplo paralisia de decisão ou de confronto de poderes (e de dinheiro, sobretudo).

Perante tamanha peixeirada, fico com a sensação de que alguém quer manter o Belenenses na I Liga e atirar o Gil Vicente para a Liga de Honra. Mesmo que o Gil Vicente tenha alegadamente cometido irregularidades no último jogo da época transacta – e sejam aquelas do fórum desportivo ou apenas laboral – a verdade é que o clube de Barcelos conseguiu no terreno aquilo que a equipa de Belém remeteu para a secretaria. Não é possível querer marcar-se golos na secretaria, quando no campo o resultado foi esclarecedor. Salvo situações graves é que poderemos admitir que se reponha ordem e se reafirme o valor da verdade no desporto com base em papéis e argumentos teóricos. Assim pudemos recentemente verificar no futebol italiano.

O que todo este caso poderá de uma vez pòr a nú é saber, afinal de contas, o peso que o futebol tem nas nossas sociedades. Será assim tão inoportuno que os clubes de futebol não possam recorrer para os tribunais comuns, quando se sentem lesados nos seus direitos? Nem mesmo como alternativa derradeira, e ainda que tivessem assumido um quadro de regulação específico e autónomo? Talvez seja a altura se conhecer o poder da FIFA. Será que Zurique manda mais que o Estado português, ou até que Bruxelas?
É de facto interessante concluir que o «caso Mateus» poderá trazer a lume a leitura exacta de onde começa e acaba o poder do futebol/FIFA – um mero poder organizacional. A FIFA não pode ser nem sequer aparentar que se apresenta como um poder supra-estatal, sob pena de se colocar em causa os fundamentos da nossa sociedade. Será que é possível aceitar com ligeireza a suspeita de que o futebol e o seu dinheiro mandam mais que tudo o resto, tal como é costume pensar-se do balanço de forças entre o poder económico e o poder político? Quem manda mais?

Deste ponto de vista, age com sensatez a direcção do Gil Vicente em prosseguir com todos os meios que dispõe, até às últimas consequências.

Depois do processo Bosman, o «caso Mateus» poderá mesmo tornar-se numa verdadeira pedrada no charco, para muitos senhores que querem fazer-nos crer que o mundo é deles, quando a bola é de todos, no azar e na sorte, de forma igual, que os 90 minutos dispuserem. Mesmo que a FIFA decida excluir as equipas portuguesas e a selecção nacional de participar em competições por si organizadas – cenário que não imagino vir a ocorrer -, o desfecho que se poderá chegar é mais importante que todos os medos e demónios que nasceram quando um simples galo decidiu enfrentar os usos do futebol.
 
Lavrado por diesnox at quinta-feira, agosto 31, 2006 | Permalink |


3 Comments:


At 12:02 da manhã, Anonymous Anónimo

O mediatismo que os dirigentes de clubes assumem nos media é um autêntico vómito. A festa dos golos não existe, não se discutem as questões técnicas do jogo, o brilhantismo de um lance...apenas vemos uns quantos homenzinhos sequiosos de se sentirem gente, em ponta dos pés para os holofotes lhes iluminarem a cara que não têm. Que triste!

 

At 11:08 da manhã, Blogger Ice-device

Apesar de, francamente, me estar marimbando para o mundinho do futebol nacional que não um ou outro jogo da selecção e do Benfica, também me parece que o pessoal quis foi mandar o Gil Vicente para a segunda divisão e pronto. Não percebi bem, mas o que está em causa é uma decisão da Liga vs decisão de um tribunal civil, certo?

Quanto ao poder da FIFA e da UEFA, não tenhamos ilusões: ele existe e manifesta-se mais do que um lobbi qualquer. é o lobbi do povo, dos adeptos de futebol, são eles que sustentam aqueles senhores, os bons e os maus. O Zidane e o Vantentim Loureiro.

Acontece a mesma coisa com a FIA [federação internacional do automóvel]. Estas organizações desportivas supra-nacionais movimentam tanto dinheiro que as suas decisões são mais fortes do que as decisões de alguns estados..

 

At 12:13 da tarde, Blogger Ice-device

Já repararam que agora vai haver mais um clássico no futebol portugês? Qual Benfica Sporting qual carapuça! O cúmulo da rivalidade será um bom Gil Vicente Belenenses. Galo/Cruz de Cristo.